É verdade, faz neste dia 39 longos anos que cheguei a Lisboa, regressado da guerra de Angola, onde permaneci dois longos anos.A data de 13 Maio ficou para sempre marcada em minha casa, a minha querida Mãe não deixava passar esta data em vão, tinha sempre uma prenda para me dar, era uma forma carinhosa de celebrar o dia da chegada do seu querido filho de terras de Angola.Por volta do meio-dia, avistamos terra pela primeira vez desde que saímos da Baía de Luanda, O “Uige” foi o navio que nos trouxe. Quando entrou na Baía de Cascais quase adornava a “bombordo”, passou-se ainda um mau bocado, pois não era fácil pedir aos militares que se distribuíssem pelo navio, tal era a ânsia de ver a costa e de poder avistar já na doca os seus familiares, noivas e amigos, tal foi a situação criada, que o Diário de Notícia na manhã do dia seguinte fez notícia na 1ª página com o título: “A Saudade Fez Adornar o Barco, chegou ontem o UIGE com tropas que cumpriram a sua comissão de serviço no Ultramar. Quando o navio se preparava para encostar ao cais, os soldados na esperança de avistarem os seus familiares que os aguardavam aglomeram-se todos a bombordo fazendo adornar o navio”.Por volta das cinco horas da tarde iniciou-se o desembarque na doca da Rocha de Conde de Óbidos, ainda que muitos no auge da sua alegria não tenham percebido, os primeiros a sair foram as urnas de alguns camaradas caídos em terras de Angola, que eu insisto em dizer que nunca os ESQUECEREI.Foi uma situação de ternura e ansiedade, e talvez mesmo de algum gozover toda a rapaziada desde o simples militar a outras patentes a “vasculhar” com o olhar o horizonte, como não podia deixar de ser, também fui dos que ansiosamente espreitou. Os pedidos dos militares para os ajudar a encontrar os seus era quase patético, ao tentar ajuda-los, acabei por descobrir os meus, talvez nesse momento algo tenha acontecido, o tempo deve ter parado, as lágrimas correram-me pelos olhos, e pela minha mente, ainda que rapidamente, percebi quanto doloroso tinha sido ter perdido dois anos da minha vida, vieram-me, ainda que inconscientemente, as caras daqueles que infelizmente vi tombar naquele período.Acho que quando sai do barco, não era o mesmo, ainda hoje não compreendo tal situação, o filme desenrolava-se como à dois anos atrás, só que agora as lágrimas eram de Alegria, a sensação de ter deixado os meus Pais com o coração apertado, tinha desaparecido, estava de volta, vestia outra couraça para enfrentar a vida. Sem ainda não ter consciência, era OUTRO.
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